Mesmo com o atraso do plantio em relação à safra passada, em função da falta de chuvas, o produtor não deve diminuir a atenção para a prevenção contra a ferrugem asiática da soja. O alerta é da pesquisadora da Embrapa Soja, Claudia Godoy, que reforça a importância da ação preventiva na lavoura.
Na temporada 2016/2017, o Consócio Antiferrugem, que monitora a ocorrência da doença no Brasil, contabilizou 415 notificações em 13 Estados. Rio Grande do Sul, com 115, Paraná, com 87, e Mato Grosso do Sul, com 64, foram os que tiveram maior número de registros.
Com a safra 2017/2018 já iniciada e o plantio em andamento em algumas regiões, o Consórcio recebeu alertas da chamada soja voluntária, em Mato Grosso e Rio Grande do Sul. O grão que permanece próximo a lavouras e germina de forma espontânea é fator de risco de propagação da ferrugem.
Claudia alerta que, em terras gaúchas, não é realizado o chamado vazio sanitário, período em que é proibido manter soja na lavoura. Já Mato Grosso acabou, de certa forma, sendo favorecido pelo período seco anterior à janela de plantio, que ajudou a elevar a eficiência do vazio no Estado e reduzir a fonte dos inóculos da ferrugem.
“O plantio deve começar com risco baixo para a doença em Mato Grosso”, acredita Claudia. Na safra 2016/2017, o Consórcio contabilizou 34 ocorrências nas lavouras mato-grossenses.
Tomando por base o Estado e também o Paraná, a pesquisadora da Embrapa avalia que, “se todo mundo atrasar o plantio ao mesmo tempo, não tem problema”. Não há risco de uma lavoura semeada antes ser caminho para a ferrugem chegar às semeadas posteriormente. De outro lado, tende a deslocar a fase reprodutiva da soja para a época de maior chuva.
“A chuva é benéfica para a produtividade da soja, mas também traz esse risco. As mesmas condições que favorecem a planta, favorecem o aparecimento da doença”, explica, lembrando que os meses de dezembro e janeiros são de maior risco de infestação das plantas.
Causada pelo fungo Phakopsora pachyrhizi, a ferrugem é considerada a principal ameaça à cultura da soja. Foi descoberta no Brasil pela primeira vez em 2001 e se espalhou por praticamente todas as regiões produtoras do país. Sua principal consequência é a desfolha precoce, com efeito negativo sobre a produtividade das lavouras.
Formado por instituições públicas e privadas, o Consórcio Antiferrugem vem monitorando e divulgado informes sobre a doença pelo menos desde a safra 2004/2005. O mapeamento inclui, além do número, o local e a fase do ciclo produtivo da soja quando os sintomas foram identificados.
De forma geral, a ferrugem começa a aparecer em novembro. A cada ano, pesquisadores como Claudia Godoy vêm reforçando a importância do monitoramento preventivo no início da safra. Destacam que a demora dificulta o controle, em meio a produtos químicos cada vez menos eficientes.
Estudos feitos durante a safra 2016/2017 e divulgados pela Embrapa Soja reforçaram a recomendação. Avaliando 39 locais de ensaio nas principais regiões produtoras do país, a intenção era medir a eficiência dos fungicidas e de novas misturas em fase de avaliação para registro.
Os resultados mostraram que “todos os tratamentos apresentaram severidade estatisticamente inferior à testemunha sem controle”. Ou seja, em todos os casos, aplicar o defensivo foi melhor. No entanto, as taxas de controle tiveram variação entre a mínima de 21% e máxima de 81%.
Poucos produtos atingindo índices mais altos, acima de 70%. A conclusão é de que a perda de eficiência continua. Menor controle significa menos produtividade. “Para esta safra, o número de opções com boa eficiência ficou menor”, alerta Claudia Godoy, que participou dos ensaios.
A ciência diz que a criação da resistência é natural, inevitável e faz parte da evolução. Em se tratando do controle de uma doença grave como a ferrugem asiática, é preciso adotar medidas para retardar esse processo. A doença está avançando mais rápido que a pesquisa.
“Estamos enfrentando muitos problemas e temos que ser mais espertos. Combinar fungicidas, variedades, a melhor época de plantio e a melhor época de aplicação”, afirma Stefano Torriani, do Comitê de Ação contra Resistência a Fungicidas (FRAC), entidade formada pela indústria de químicos.
Para ele, mesmo sendo um processo natural, a resistência a fungicidas está entre os principais fatores de risco para a agricultura atualmente. Está ligada de modo particular ao uso incorreto ou até mesmo ao que chama de abuso na utilização dos defensivos.
“Temos que usar o fungicida correto, registrado e de maneira correta para evitar a resistência e fazer com que a vida útil do fungicida aumente”, diz ele, que também é especialista da Syngenta nesse tipo de produto.
Embora a aplicação do fungicida na lavoura seja papel do agricultor, ele não está sozinho, pondera Torriani. Às empresas, cabe colocar a linha correta de produtos no mercado com a devida orientação de uso. E aos governos, atentar para o que acontece no campo e na indústria.
Texto: Revista Globo Rural
Foto: José Medeiros/Ed. Globo