Com uma produção anual de 34 mil toneladas de peixes, segundo levantamento de 2016 da Associação Brasileira de Aquicultura (ABRAq), a piscicultura – um dos ramos da aquicultura - se beneficia do clima favorável e da localização estratégica de Goiás. O Estado é banhado por quatro importantes bacias hidrográficas - Tocantins, Araguaia, São Francisco e Paranaíba. Carro-chefe, a tilápia corresponde a 40% dos peixes criados.
Atividade de cultivo de organismos cujo ciclo de vida em condições naturais se dá total ou parcialmente em meio aquático, a aquicultura é praticada pelo ser humano há milhares de anos. Existem registros de que os chineses já tinham conhecimentos sobre essas técnicas há muitos séculos e de que os egípcios criavam a tilápia há cerca de quatro mil anos.
A aquicultura pode ser realizada em qualquer tipo de água - doce, pouco salinizada ou marinha - desde que esta água tenha qualidade para o que será cultivado. Cada organismo que será cultivado necessita de uma qualidade de água específica. Assim, parâmetros como oxigênio, temperatura, compostos nitrogenados (amônia, nitrito, nitrato), metais, entre outros, irão variar conforme o cultivo, a ração fornecida, a insolação recebida e o contato com diferentes tipos de solo, por exemplo.
A aquicultura contempla diversas especialidades. Enquanto a piscicultura abrange a criação de peixes, tanto em água doce ou marinha, a malacocultura diz respeito à produção de moluscos, como ostras, mexilhões e vieiras. A ostreicultura trabalha com as ostras; a mitilicultura, com mexilhões; a pectinicultura, com vieiras; a carcinicultura, com camarão; a algicultura atua com o cultivo de macro ou microalgas e a ranicultura com o de rãs.
Incremento
Conforme explica o presidente da Comissão de Aquicultura da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Paulo Roberto Silveira, o cultivo de peixes nas águas goianas tende a aumentar. Segundo ele, com a utilização de reservatórios nacionais ou das Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), de responsabilidade estadual, os números atuais podem até ser triplicados. “Na PCH, é utilizado o sistema de tanque-rede, com gaiolas flutuantes que também podem ser usadas em represas, dentro de propriedades particulares”, explica.
Silveira lembra que em junho foi autorizada a criação de peixes no sistema tanque-rede, no parque agrícola de Serra da Mesa, no extremo Norte goiano. “Somando o que foi outorgada em Serra da Mesa e em Canabrava, temos algo em torno de 21 mil toneladas de peixe. Ou seja, entregues esses contratos, estamos falando de um incremento de mais de 60% do que Goiás produz”, comemora.
Já o sistema de caixa d’água se adequa às propriedades familiares, enquanto os tanques suspensos permitem trabalhar com um sistema de recirculação da água. “Esse sistema fechado também pode ser usado pelo bioflocos: bactérias cultivadas na água que servem como alimento para peixes ou camarão, que podem ser criados separadamente ou de forma consorciada”, detalha.
Grandes reservatórios nas regiões Sul e Sudeste podem incrementar a piscicultura goiana, como comenta o presidente da Comissão de Aquicultura da Faeg. Outro método – o do viveiro escavado - presente no Vale do Araguaia, nos Entornos de Brasília e de Goiânia, também se destaca. A expressiva produção de grãos ainda dá a Goiás a vantagem de fabricar a ração que alimenta os peixes. “Estamos próximos de dois grandes centros consumidores de peixe: Goiânia e Brasília, um mercado que temos condições de atender”, frisa.
Licença ambiental
Para se tornar um piscicultor, é necessário observar alguns requisitos, como a qualidade de água e do solo na propriedade; o estudo de viabilidade técnica e econômica, além do registro de aquicultor. Hoje, são cerca de 2 mil produtores nesta atividade, em Goiás, segundo dados da Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (Emater). Porém, apenas 14% desse total tem licenciamento ambiental, o que aponta para um dos principais problemas a serem enfrentados pela cadeia.
O presidente da Comissão de Aquicultura explica que o licenciamento ambiental é regido pelo Estado, por meio de um decreto, considerado defasado pelo setor. Ele informa que Faeg, a Associação Goiana de Piscicultura (AGP), a Universidade Federal de Goiás (UFG), a Universidade Estadual de Goiás (UEG) e a Pontifícia Universidade Católica de Goiás (PUC Goiás) fizeram uma revisão do documento e apresentaram as mudanças à Secretaria do Meio Ambiente e Cidades (Secima).
O foco, frisa, é evitar que a lei deixe margem para interpretações que acarretem mudanças desnecessárias. As alterações no decreto foram encaminhadas à Assembleia Legislativa de Goiás (Alego) e devem ser votadas neste semestre. A ideia é transformá-lo em um projeto de lei que vai regulamentar a aquicultura em Goiás. “Além de facilitar o acesso a linhas de créditos, o licenciamento dá segurança a quem vai consumir o peixe. A aquicultura está em plena expansão. Nas próximas décadas, a piscicultura tem um potencial de aumento de 100%. Nosso objetivo é valorizar e aumentar nossa produção”, enfatiza Silveira.
Da criação à comercialização
O sucesso da atividade já é conhecido pelo piscicultor Raul Lima, da Lake’s Fish, que além de cultivar os peixes também atua no abate e na comercialização de tilápias. O trabalho na Fazenda Bacupari, em Niquelândia, no Norte goiano, foi iniciado em 2012. Dois anos depois, veio o frigorífico. “Percebemos a dificuldade do mercado, que não tem toda a cadeia formada. Então, decidimos abrir um frigorífico para escoar a nossa produção”, recorda.
Atualmente, são 450 tanques-rede destinados à engorda das tilápias. Tratados quatro vezes aos dias, os animais são abatidos ao alcançar, em média, 900 gramas. Por dia, em média, são abatidas 7 toneladas. Os filés são comercializados em Goiás, Distrito Federal, Mato Grosso, Minas Gerais, Rio de Janeiro e Tocantins. Em Goiânia e em Brasília, inclusive, há um serviço de delivery. “Entregamos em pequenos volumes para pessoas que preferem receber o peixe em casa. Ele é abatido em um dia e já no seguinte chega ao consumidor final”, explica.
Lima conta que a abertura do frigorífico, em 2014, trouxe ainda outra oportunidade para a empresa. É que a cada um quilo de tilápia, apenas 300 gramas se tornavam filés. O restante era descartado. “Uma coisa vai levando a outra na cadeia da tilápia. Para não jogar os dejetos na natureza, optamos por montar a indústria de reciclagem animal, onde fabricamos farinha e óleo. Eles são vendidos para outras empresas onde viram ração pet, sabão e biodiesel”, enumera.
De Rianápolis, no Vale do São Patrício, vem outro exemplo positivo da piscicultura goiana. Na Morada do Peixe são criados e comercializados alevinos - matéria prima desse sistema de produção – juvenis e adultos, vivos ou abatidos; peixes como tambaqui, tambacu, tabatinga e o bagre, além de ração. A atividade iniciou há mais de 20 anos com o pai do piscicultor Victor Caetano, como um hobby. Há seis, o que era uma diversão virou negócio. “Começamos com alevinos e hoje engordamos peixes para vender aos pesque-pague e para o consumidor final”, descreve.
A propriedade tem 49 taques escavados – um terço para alevinos e o restante para a engorda - e, por mês, são comercializadas 5 toneladas de peixe. O produto chega a um raio de 150 quilômetros ao redor do município, atendendo principalmente comerciantes. “O mercado se mostra muito positivo e com uma oferta pequena para a demanda. É um negócio que traz bem-estar para o produtor também”, analisa ele, que investe no manejo, na qualidade da água e da ração.
Treinamentos
A formação de piscicultores pode contribuir para a estruturação da cadeia produtiva em Goiás. Com esse foco, o Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) Goiás oferece formações voltadas para a piscicultura. “São cursos que abordam o manejo em geral e trazem qualificadas para o produtor no tocante à atividade, à produção dos alevinos e à comercialização”, explica a gerente de Formação Profissional Rural (FPR) da entidade, Samantha Andrade.
Ela informa ainda que o curso Técnico em Agronegócio também aborda a piscicultura. “Temos bacias hidrográficas cortando o Estado e produtores muito comprometidos. Falta melhorar a cadeia”, analisa. Os cursos estão com inscrições abertas durante todo e ano e para se matricular o interessado deve procurar um dos parceiros do Senar em sua cidade, como associações, cooperativas e o Sindicato Rural (SR). A agenda fica disponível no site: www.senargo.org.br.
Águas produtivas
* Aquicultura:
- Atividade de cultivo de organismos cujo ciclo de vida em condições naturais se dá total ou parcialmente em meio aquático.
- É praticada pelo ser humano há milhares de anos.
- Pode ser realizada em qualquer tipo de água, desde que esta água tenha qualidade para o que será cultivado.
- Parâmetros de água como oxigênio, temperatura, compostos nitrogenados (amônia, nitrito, nitrato), metais, entre outros, irão variar conforme o organismo.
* Especialidades:
- Piscicultura: peixes, em água doce e marinha
- Malacocultura: produção de moluscos, como ostras, mexilhões e vieiras
- Ostreicultura: ostras
- Mitilicultura: mexilhões
- Pectinicultura: vieiras
- Carcinicultura: camarão
- Algicultura: cultivo de macro ou microalgas
- Ranicultura: criação de rãs
* Requisitos:
- Qualidade de água e do solo na propriedade;
- Licenciamento ambiental regido pelo Estado;
- Estudo de viabilidade técnica e econômica (tempo de retorno do capital investido);
- Aptidão do produtor e do técnico em desenvolver uma atividade que produz comida de qualidade e/ou animais de companhia (pet);
- Projeto bem estruturado, mesmo que os cultivos sejam pequenos);
- Registro de aquicultor.
(Fonte: Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento)