Era dia 25 de setembro de 2019 quando a vazão do Rio Meia Ponte em Goiânia ficou em 1.481 litros por segundo (l/s) no ponto de captação da Saneago. O índice, se mantido por mais alguns dias, iria estabelecer o rodízio no abastecimento público na região metropolitana.
Desta forma, seria um dia sem água, outro em estabilização e, no seguinte, haveria a normalização. Neste ano, a situação é bem menos crítica e as respostas sobre o que houve de diferente apontam para mais chuvas no início do ano e ações de monitoramento no manancial. No ano passado, o apuro acabou mais cedo porque setembro teve precipitações maiores que as deste ano.
No sábado (10/10), antes das primeiras chuvas significativas que deram fim ao período de estiagem, a vazão informada do Meia Ponte pela Sala de Situação disponível no site da Saneago era de 3.449 l/s. Oficialmente, o manancial está no nível crítico 1, em uma escala que vai até 4, conforme a piora do cenário.
O primeiro fator que contribuiu para a preocupação ser menor neste ano no manancial foi a chuva. De janeiro a abril, a estação de Goiânia, que costuma captar a tendência também para o interior do Estado, apurou 1.031,4 milímetros (mm) de precipitação. O índice ficou 20% superior à média histórica para o período. Embora no recorte do período chuvoso (de setembro/2019 a abril/2020), conforme mostrou O POPULAR na edição do último dia 1º, o total tenha ficado 9% inferior ao habitual, os primeiros meses deste ano foram generosos quanto às chuvas.
Analista técnica do Instituto para o Fortalecimento da Agropecuária de Goiás (Ifag), Jordana Sara acredita que as chuvas contribuíram para a menor criticidade do Alto Meia Ponte, porção da bacia que se estende por 11 municípios: Brazabrantes, Campo Limpo de Goiás, Damolândia, Goiânia, Goianira, Inhumas, Itauçu, Nerópolis, Nova Veneza, Ouro Verde de Goiás e Santo Antônio de Goiás. Integrante do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Meia Ponte, a analista acrescenta que a situação atual também é resultado do trabalho de campo da instituição. "A gente segue com as orientações para os nossos usuários que são do setor agropecuário para sempre fazer o uso racional e com o sistema mais eficiente. A assistência técnica é uma grande aliada para este processo." A aplicação de bacias de contenção e o plantio em curvas de nível também estão sendo empregados para favorecer a fixação da água no solo, segundo Jordana.
Jordana conta que, como a disponibilidade hídrica na bacia está muito comprometida, as outorgas não são emitidas desde 2016. Ela diz que algumas mudanças estruturais que dependem de investimento têm sido dificultadas porque muitos produtores, embora façam captação "há décadas" no manancial, não possuem a autorização legal para tal. "Isso dificulta, por exemplo, ele conseguir um financiamento bancário."
A analista do Ifag acrescenta que a situação atual da bacia preocupa os produtores. Ela diz conhecer casos em que a lavoura deixou de ser plantada neste ano ou teve área menor. O sentimento de apreensão dos produtores pode estar associado à situação dos últimos anos, quando o Estado lacrou bombas irregulares e, em 2019, atuou para que barramentos fossem liberados com o objetivo de reforçar o abastecimento público. As captações, inclusive as outorgadas, sofreram restrições para que fizesse valer a Política Nacional de Recursos Hídricos (PNRH), que estabelece a prioridade para o abastecimento público e a dessedentação de animais no uso da água.
Cadastro
Atualmente, de acordo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), há 740 produtores que fazem algum uso hídrico na bacia e que não estão outorgados. Entretanto, segundo o superintendente de Recursos Hídricos da pasta, Marco Neves, o foco são 236 irrigantes que captam água direto nos afluentes e no Meia Ponte em si. O motivo, diz Neves, é que estes últimos fazem uso mais significativo quanto ao volume.
A última leitura da vazão em Goiânia, ontem (15), referente à manhã, era de 5.980 l/s. Se a condição permanecer por uma semana, o manancial sai da condição de nível crítico, como prevê deliberação do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio Meia Ponte. A condição é reflexo das chuvas que neste mês somam 38,6 milímetros. O valor corresponde a aproximadamente um quarto do que é esperado para todo o mês de outubro. Felizmente, a meteorologia prevê que este ano tenhamos chuvas dentro da média.
Estudo vai permitir plano de uso de manancial e pode viabilizar outorgas
De acordo com o superintendente de Recursos Hídricos da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), Marco Neves, 40 propriedades receberam motobombas que informam a cada 2 minutos o uso e a potência na qual está sendo operado o equipamento. "Com isso, estamos entendendo qual é a cultura de irrigação, para que a gente possa ir regularizando", explica. Os 236 irrigantes têm consumo estimado de 1.200 l/s. Todos os 740 produtores foram cadastrados. A regularização do uso depende de um diagnóstico que está em curso, bem como a elaboração de um plano para o uso do recurso hídrico na região. Também foram instaladas duas estações que monitoram, praticamente em tempo real, a vazão do rio.
Marco Neves afirma que as informações sobre a condição do Meia Ponte foram levantadas por uma equipe da Universidade Federal de Goiás (UFG), contratada para isto. A partir do próximo dia 20, será apresentado o prognóstico dos recursos hídricos do Meia Ponte e também de outros três mananciais que compõem a Bacia Hidrográfica do Paranaíba: São Marcos, Rio dos Bois e Corumbá-Veríssimo. A previsão é que os planos estejam concluídos no primeiro semestre do próximo ano.
A solução para o abastecimento público da região metropolitana de Goiânia depende de interligações com o sistema João Leite e de novas fontes que possam suportar o crescimento da demanda por água. Questionada sobre quando o estudo hidrológico deve ficar pronto, a Saneago respondeu, em nota, que isto está previsto para ocorrer no próximo mês.
Fonte: O Popular
Imagem: Divulgação