Legislação pode modernizar processo de registro e trazer maior eficiência na proteção das lavouras, menor impacto para o meio ambiente e aos consumidores e impulso para pequenos produtores
Katherine Alexandria, especial para a Revista Campo
Na dose certa e quando é preciso. A afirmativa de entidades ligadas ao agronegócio é semelhante a essa quando se trata das necessidades de combater pragas e doenças na produção de alimentos. Em discussão na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei nº 6.299 de 2002 propõe modernizar a legislação que trata sobre o registro de defensivos agrícolas no Brasil. O objetivo é dar maior celeridade aos procedimentos de registro de novos produtos, garantindo a entrada de moléculas mais modernas e eficientes para serem utilizadas nas lavouras brasileiras, além de adequar a legislação com os padrões e conceitos utilizados em outras partes do mundo.
Em 25 de junho, o texto principal foi aprovado por 18 votos a favor e nove contrários na Comissão Especial da Câmara Federal que analisou a matéria, seguindo agora para votação em Plenário. Entre os pontos discutidos no projeto um dos destaques é a mudança da nomenclatura destes produtos, atualmente chamados de “agrotóxicos” e que na nova proposta passarão a ser chamados oficialmente de “pesticidas”, sendo este o conceito utilizado na grande maioria dos países. Outro ponto importante é a alteração dos prazos para que os órgãos reguladores, como a ANVISA e o IBAMA, realizem as avaliações necessárias dentro do processo de registro. Hoje os prazos da lei atual não são cumpridos. Através da nova proposta estes períodos serão ampliados, sendo que para novos produtos ficou estabelecido em 24 meses, garantindo tempo hábil para que análises sejam realizadas de forma criteriosa.
Visando evitar a ocorrência de morosidade nas análises e estimular a ampliação da estrutura destes órgãos voltadas ao tema, o Projeto propõem também a criação do Registro Temporário, através do qual o Ministério da Agricultura poderá autorizar o uso do produto no país mesmo sem a conclusão dos procedimentos, desde que o prazo estabelecido não tenha sido cumprido e que o produto tenha autorização em pelo menos 3 países enquadrados na Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), os quais possuem legislação e parâmetros semelhantes aos brasileiros.
A proposta prevê também que que os processos de registro de novos pesticidas sejam concentrados no Ministério da Agricultura, utilizando uma plataforma digital para operacionalização dos mesmos, garantindo maior transparência no acompanhamento de sua evolução. Mesmo assim, todos os procedimentos referentes as análises de impactos e riscos à saúde e ao meio ambiente permanecerão sob responsabilidade da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), os quais mantêm a responsabilidade de definir quais são as análises e estudos a serem apresentados pelas empresas que buscam o registro, sendo responsáveis também pela validação destes procedimentos.
Essas alterações na legislação geraram fortes debates no país. Segundo o presidente em exercício da Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg), Bartolomeu Braz Pereira, a lei virá em momento importante para o setor, pois a produção de alimentos em um país tropical como o nosso é desafiadora e hoje o processo de registro é muito lento, demorando até nove anos para que produtos mais modernos possam chegar ao mercado. “Como estes produtos são mais eficientes no combate às pragas e doenças, sua utilização promoverá um menor número de aplicações a serem feitas nas lavouras, diminuindo a quantidade de químicos em nossos cultivos”. Bartolomeu salienta que estes métodos de manejo devem ser aplicados com muito critério, através de recomendação de profissional especializado (agrônomos), cumprindo também todas as regras de segurança aos aplicadores e ao meio ambiente. “O Sistema FAEG/SENAR oferece diversos cursos para que produtores e trabalhadores rurais possam realizar os procedimentos de forma correta, garantido a eficiência e a segurança no manuseio dos pesticidas”.
Desde 2005, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) também manifesta descontentamento com o funcionamento do sistema de registro de defensivos no País. “No Canadá, o registro de um produto baseado em molécula nova leva um tempo de 24 meses e de um genérico de 12 a 15 meses”, diz o coordenador da área de tecnologia da CNA, Reginaldo Minaré. Nos Estados Unidos, o prazo também é menor, para produto genérico o tempo de registro é de 12 a 18 meses. “Um sistema de registro moroso como o brasileiro não é interessante para os agricultores. Além de prejudicar o acesso aos novos produtos e inibir a concorrência, essa morosidade é impeditiva para a inovação empresarial. Qual investidor vai colocar recursos em uma empresa, esperar no mínimo cinco anos para pesquisar e desenvolver um produto e esperar oito ou dez anos para obter um registro, só assim começar a recuperar o que investiu? Isso só favorece a atual concentração do mercado de defensivos em grandes multinacionais”, informa.
Já do lado do produtor, Minaré reforça que ao seguir as recomendações técnicas e usar somente quando for necessário para proteger as lavouras das pragas e das ervas daninhas, defensivos agrícolas são insumos garantidores da produção. “Países como Estados Unidos, Alemanha, Japão, França e Holanda, que estão na vanguarda da inovação tecnológica, também utilizam esses produtos em larga escala. Lá, igual aqui, a ciência ainda não apresentou uma alternativa disruptiva, que atenda as necessidades do campo”. Minaré reforça que o agricultor precisa cuidar de sua proteção e de seus funcionários, do meio ambiente em sua propriedade e dos consumidores. “No caso da proteção aos consumidores, o agricultor precisa respeitar o prazo de carência após a aplicação para só assim vender sua produção. Fazendo isso a segurança está garantida”, pontua sobre respeitar as recomendações técnicas tanto para uso como armazenamento e transporte.
Para o produtor de grãos de Silvânia, Adriano Afonso Van Lieshout, os defensivos são essenciais nos seis mil hectares plantados, tanto para milho como para soja e feijão. “No nosso País, as doenças e insetos permanecem durante todo o ano, não temos quebra de ciclo como acontece nos Estados Unidos e Canadá, que têm frio intenso. Em função disso, precisamos de produtos bons”, diz. Ele considera que sem defensivos não conseguiria trabalhar. “Acho que hoje temos produtos seguros no mercado, com menos toxidade. Estes produtos são aplicados mediante receituário agronômico, e nós também estamos em dia com o que o Ministério do Trabalho pede sobre os equipamentos de segurança obrigatórios”, acrescenta.
Bartolomeu Braz Pereira, presidente da Faeg, defende que haverá impulso em diversas cadeias do setor e especialmente para pequenos produtores, como os de hortifrúti, o que gerará impactos positivos para o consumidor final. Reginaldo Minaré, da CNA, lembra que há inclusive problema grave relacionado ao uso de defensivos não registrados para as culturas menores, especialmente frutas e hortícolas, o que é amplamente conhecido e ponto crítico em relatórios do Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (PARA) da Anvisa. “Até o momento, o poder público não adotou medidas eficazes para impedir que essa situação se perpetue. A nova legislação pode solucionar este problema, garantindo que só sejam utilizados produtos que tiveram seus efeitos estudados nestas culturas”, diz.
Se o projeto de lei for aprovado, ele defende que ao racionalizar o processo de registro e permitir que instituições representativas dos agricultores solicitem o registro de determinado produto para determinada cultura, há potencial para solucionar o problema que se arrasta por décadas. Está no texto essa possibilidade de entidades como a CNA solicitar o registro quando a indústria não tiver interesse em propor. “Salvo as grandes culturas como soja e milho, grande parte de frutas e hortaliças possuem pouco ou nenhum produto registrado para o controle de pragas”, reforça.
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