Michelle Rabelo
A seca histórica no interior de São Paulo causou a interrupção do transporte de grãos por meio da Hidrovia Paraná-Tietê e voltou os holofotes da imprensa e a atenção dos especialistas para o setor hidroviário. Na manhã desta quinta-feira (11), a Federação da Agricultura e Pecuária de Goiás (Faeg) foi palco de um seminário durante o qual foi debatido, entre outros aspectos, a falta de investimento neste modal de transporte.
Os efeitos negativos trazidos pela seca paulista abalaram a rentabilidade do setor, já que aumentaram significativamente o preço do frete no momento em que o produtor precisa transportar a safra por via rodoviária. A ideia defendida pelos participantes do seminário é melhorar os sistemas modais de transporte de grandes volumes – que atingem diretamente o setor de grãos – buscando uma maior eficiência e um menor custo.
A pauta de discussões foi composta também pela apresentação do Plano de Melhoramentos da Hidrovia Paraná- Tietê, famosa por sua importância para a economia. Além disso, o objetivo do seminário, que tem a Faeg como correalizadora, foi debater a viabilidade de novos potenciais de carga para os rios da Bacia do Paraná. Também foram discutidas maneiras de melhorar a capacidade de escoamento da via, que liga as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do país.
Para o presidente da Faeg, Leonardo Ribeiro, discussões como a que ocorreu na sede da entidade são fundamentais para que o poder público se sensibilize e entenda a necessidade de transportes mais eficientes e mais baratos. “É uma incoerência muito grande um país que tem hoje a maior malha hidroviária do planeta, não fazer uso desse modal”, pontuou. “Nós queremos acreditar que através de eventos como este e do envolvimento dos setores que representam os produtores, o governo se sensibilize e entenda que há possibilidades de melhorias. Há possibilidades de investirmos em modais mais eficientes e de termos condições de evitar que a renda do produtor diminua”.
Conhecimento de causa
Para falar sobre a Paraná-Tietê, a administradora da Hidrovia do Paraná (Ahrana) apresentou também os novos potenciais de carga, um planejamento das obras que devem acontecer entre 2015 e 2040, as ampliações necessárias para que a via ganhe multimodalidades e o projeto de um novo corredor de escoamento de produção.
Segundo o superintendente da Ahrana, Antônio Chehin, atualmente 1.600 km da hidrovia Paraná-Tietê são utilizados. A intenção é desenvolver a via ao longo do interior dos estados – o que inclui Goiás – levando a carga por um custo mais baixo até seu destino final. “Hoje apresentamos um estudo de viabilidade técnica, econômica e ambiental de todos os rios da bacia do Paraná. O que queremos é transportar os produtos com melhores condições de navegabilidade, de navegação, de transporte e de logística”, explica.
Plano de melhorias
Leonardo Ribeiro disse que a elaboração de um plano, assim como a realização de estudos é de extrema importância, pois “as mudanças podem proporcionar a redução significativa de custos e o aumento da capacidade produtiva do setor agropecuário. O alto custo tem consequência direta na vida do produtor”.
A Ahrana fez um levantamento das formas de melhorar e potencializar a via apresentou os resultados para um público ligado à área de logística e que contribuiu muito para o debate do tema. O objetivo é que o plano seja finalizado até 2027 e que o potencial da hidrovia – que hoje é de 6.500 toneladas para o porto de Santos (SP), sendo que 80% são de São Simão (GO) – aumente significativamente.
Antônio Cheim, superintendente da Ahrana, explica que o projeto deve passar por três fases e a primeira delas é exclusivamente é preparar a hidrovia para receber as melhorias. Será o momento para a construção de eclusas, a regularização de leito, a adequação de pontes e a sinalização e balizamento.
Para o gerente de assuntos técnicos e econômicos da Faeg, Edson Novaes, o plano pode ser a solução para o transporte em Goiás – estado com grande potencial agrícola – já que com a intermodalidade, haveria uma diminuição da pressão sobre as rodovias.
Do papel para a prática
"Os países da Europa que apostaram em Hidrovias foram os primeiros a saírem da crise econômica", disse o superintendente da Ahrana, assim que subiu no palco do auditório da Faeg. Antônio Cheim disse ainda que antes de se falar em melhorias e até mesmo no Plano que prevê mudanças na via, é preciso “arrumar a casa” e acabar com os gargalos que cercam os rios Paraná e Tietê até a região de Rio Grande. Essa fase deve durar até 2025, quando se iniciarão, de fato, as melhorias.
Ele defende que o investimento, que gira em torno de R$25 milhões, seja feito paulatinamente já que não é possível melhorar toda a malha hidroviária brasileira devido a sua extensão. O fato é que o Governo Federal ainda não tem um planejamento de como investir no setor hidroviário – de maneira integrada com os outros modais e beneficiando todas as bacias brasileiras.
Segundo Chehin, são vários os motivos para se investir em hidrovias: o custo do transporte por água é mais barato e ambientalmente mais correto, os países que investem no transporte hidroviário reduzem seu custo logístico, a viagem entre São Simão e Pederneiras teria seu tempo reduzido, não há necessidade de dragagem nem derrocamento, entre outros.
Debate
Segundo o 1º vice-presidente da Federação das Indústrias de Goiás (Fieg), Wilson de Oliveira, enquanto todo mundo fala de competitividade e de globalização, a indústria brasileira caiu 16 posições no ranking mundial de competitividade. “Da porta para dentro, os empresários seguem investindo, mas da porta para fora ele esbarra nos encargos tributários, em uma legislação trabalhista complicada e, o mais grave, em uma falta de infraestrutura que impacta diretamente no bolso dos empresários”.
Ele citou a necessidade de reformar o trecho da Hidrovia Paraná-Tietê que atinge o município de São Simão. “Se a gente não integrar o trem, o caminhão e a hidrovia, nossos esforços terão sido em vão. O transporte intermodal é a vocação política de Goiás”.
O consultor técnico do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar) Goiás para a área de assuntos econômicos, Pedro Arantes, falou sobre a importância da via não só para exportar o que é produzido em solo goiano, mas também para abastecer o Estado como um todo.
Antônio Ismael Ballan, diretor de logística da Caramuru, também participou do debate e fez questão de ratificar o momento atual pelo qual as hidrovias estão passando por causa da estiagem. “Precisamos desmitificar a ideia de que não há água. Tem água sim. É claro que existem gargalos locais e que há muito para melhorar, mas esse é um modal compensatório”.
Além da Faeg, representantes do Ministério dos Transportes, do Departamento Nacional de Infra-Estrutura dos Transportes (DNIT), da Federação das Indústrias de Goiás (Fieg) e da Associação Goiana de Municípios (AGM) estarão presentes.