A batata doce está cada vez mais presente na alimentação da população. Tanto é que a comercialização do tubérculo cresceu 40% nos últimos quatro anos em Goiás
Considerada um dos tubérculos mais
completos em termos nutricionais, a batata doce tem ganhado espaço no cardápio até
de quem não é atleta, mas busca uma alimentação saudável. As vendas da raiz nas
Centrais de Abastecimento de Goiás (Ceasa Goiás) cresceram quase 40% nos
últimos quatros anos. Apenas em 2018, o produto movimentou mais de R$ 21,5
milhões em Goiânia com a comercialização de 18.705 toneladas.
Para o gerente da divisão técnica da Ceasa, Josué Lopes, os números positivos são resultado de uma soma de fatores. “A população está mais consciente da importância de se manter hábitos saudáveis e, por isso, tem colocado a batata doce no dia a dia como forma de qualidade de vida. A raiz também está inserida na dieta de atletas e esportistas. Além disso, é um alimento muito versátil e barato. Então, pode-se dizer que ela se tornou a queridinha dos goianos”, explica.
Segundo dados da Ceasa, nem toda a demanda é absorvida pela produção goiana. A batata doce também é comprada de outros Estados. Ao longo do ano passado, Bahia, Distrito Federal, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina auxiliaram no abastecimento da raiz. Mas vale destacar que a participação de outras unidades federativas, além de ser mínima, tem caído. Se em 2015 foram adquiridas 612 toneladas, em 2018 esse montante caiu para 112. O valor representa apenas 0,62% do total comercializado na Ceasa no ano passado. “A batata doce é um produto tradicionalmente produzido pelo Estado, mas, algumas vezes, essa produção não consegue atender a uma alta repentina da demanda. Pode ocorrer queda na produção ou atraso na colheita e o produtor, para não perder cliente, tem que buscar o tubérculo em outro local. Mas isso tem diminuído, porque os produtores estão sabendo planejar melhor sua produção e estão investindo na qualidade do produto e em técnicas de irrigação”, ressalta Josué.
O agricultor Divino Vieira de Souza produz batata doce há 15 anos em uma área de 62 hectares, localizada em Leopoldo de Bulhões. Ele aumentou sua área plantada em cinco hectares nesta safra para dar conta da demanda. Mesmo assim, teve que comprar o produto de São Paulo. “Eu tenho clientes fidelizados, que só compram de mim. Como eu não consegui colher antes, devido à falta de chuva, eu preferi comprar de outro Estado. Onera um pouco mais meu custo, mas não corro o risco de perder o cliente”, explica Divino.
Em 2018, a produtividade na fazenda de Divino foi de duas mil caixas de 22 quilos por hectare. No final do ano passado, a caixa estava sendo vendida a R$ 30. “2019 começou com preços em queda, por conta do aumento na oferta, mas espero que eu feche essa safra com produtividade alta e preços bons”, acredita o produtor.
Divino está entre os 70% dos produtores goianos que destinam a batata doce para a Ceasa, que é o principal mercado do Estado. Em 2018, os espaços das Centrais receberam 18.567 toneladas de batata doce provenientes só de plantações de Goiás. Além de Leopoldo de Bulhões, Cristalina também se destaca como um dos maiores produtores de batata doce do Estado. A maior parte das vendas da Ceasa é destinada ao consumo interno no estado, segundo Josué Lopes. Mas o produto goiano também chega em Mato Grosso, Tocantins, Maranhão e Distrito Federal.
Na falta de chuva, a técnica
Sérgio Sanches de Melo, também de Leopoldo de Bulhões, cultiva a batata doce há mais de 20 anos. Ele espera colher, em março, a primeira safra desse ano da área de 10 hectares, onde é utilizada a técnica de sequeiro. A produtividade esperada é de 1.100 caixas de 25 quilos por hectare, a mesma registrada no ano passado, quando foram colhidos 27 toneladas. Sérgio divide o espaço da batata doce com outras culturas, como cenoura, beterraba, milho, repolho e soja, como forma de diversificação estratégica para evitar prejuízos. Apesar disso, ele avalia a produção do tubérculo como lucrativa. “O consumo nos últimos anos aumentou significativamente e a batata é um produto de custo baixo e que demanda pouco investimento. O meu custo da última safra, por exemplo, ficou em R$ 5,80 por hectare e a caixa foi vendida por R$ 30”, explicou. Sérgio tem uma área irrigada para o plantio da raiz, mas pensa em diminuir de 100 hectares para 50 hectares este ano. “Vou começar a plantar a segunda safra em abril e até lá eu vou ter uma noção de como estarão os preços, a oferta e a demanda”, completa o produtor, que destina toda sua produção para uma empresa.
Ele diz que as técnicas para manter o solo úmido e não depender do clima foram investimentos necessários. “Na fase inicial, a batata doce exige água. Se não tem, o tubérculo não cresce e eu tenho prejuízo no peso. Os investimentos nessas técnicas minimizam o impacto de déficit hídrico e me garante uma boa produtividade”, explica Sérgio. Além dessas técnicas, a irrigação pode ser feita por aspersão ou gotejamento.
Mão de obra
A plantação e a colheita do tubérculo nas duas propriedades são feitas manualmente e, por isso, os produtores recrutam funcionários extras nessas duas fases do manejo. Divino contrata 30 auxiliares e Sérgio conta com 25 ajudantes. “De forma geral, são duas safras por ano de batata doce, ou seja, em quatro momentos há o aumento de mão de obra da porteira pra dentro. Isso gera emprego, renda e economia para o próprio município”, afirma o engenheiro agrônomo da Agência Goiana de Assistência Técnica, Extensão Rural e Pesquisa Agropecuária (Emater Goiás), Ouriçanga Bastos Junior. Ele reforça que a Emater tem trabalhado junto aos produtores para levar novas técnicas de manejo, otimizando a produção. “Esses trabalhadores podem ser capacitados. Investir no trabalhador é investir na propriedade. Mesmo que haja a mecanização no futuro, o operador será indispensável”, pontua.
Manejo
A batata doce é uma planta de usos múltiplos, podendo ser utilizada na alimentação humana e animal, assim como na produção de biocombustível. De cultivo rústico e pouco exigente em adubação e com boa tolerância ao déficit hídrico, a batata doce deve ser plantada em solos mais leves, arenosos ou areno-argilosos, bem estruturados e drenados, e com boa aeração. As plantas escolhidas para o plantio devem ter de cinco a oito nós, de onde sai a raiz quando enterrada no solo.
A pesquisadora da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), Larissa Pereira de Castro Vendrame, complementa que a temperatura média para o cultivo da batata doce deve ser de 30ºC durante o dia e de 20ºC no período noturno. “A região Centro-Oeste é bem propícia para a propagação da planta, que não tolera geadas e consegue enfrentar estiagem”, explica ao frisar que o tubérculo não necessita de aplicação de fungicidas ou inseticidas.
A adubação pode ser química ou orgânica, mas é importante usar mudas sadias para o sucesso do cultivo. Como trata-se de uma cultura de ciclo curto, a batata doce está pronta para ser colhida em um período de 100 a 150 dias após o início do plantio.
Pesquisa
Atualmente existem 29 variedades de batata doce registradas no Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa). A mais produzida e, portanto, mais consumida no Brasil e em Goiás é a batata roxa, desenvolvida pela Embrapa. Entre as cultivares existentes, a batata doce Beauregard, de origem norte-americana, tem se destacado pela quantidade de betacaroteno – nutriente que se transforma em vitamina A no organismo humano. De casca mais rosada e polpa laranja, esse tipo do tubérculo possui 100 miligramas de betacaroteno para cada quilo de batata, enquanto uma batata doce comum tem de 5 a 10 miligramas. Essa cultivar está ganhando a terra brasileira aos poucos.
A batata roxa e a Beauregard integram o programa de melhoramento genético da Embrapa Hortaliças, que visa disponibilizar para o setor produtivo cultivares com melhor desempenho agronômico e qualidade de raiz. “Nosso trabalho é voltado para a distribuição das plantas no campo, adensamento, produção de mudas, qual a melhor forma da disposição dessas mudas e como melhorar o mercado que ainda é muito informal. Também estudamos e promovemos novas combinações genéticas. Vale ressaltar que esse trabalho não tem ligação com a transgenia”, destaca a pesquisadora. A iniciativa está em seu terceiro ano e tem Goiás como ponto de pesquisa e desenvolvimento de clones selecionados.
Para favorecer o aumento do consumo, a pesquisa também visa a melhoria do formato e da qualidade das raízes, fatores que estão diretamente relacionados ao mercado consumidor. “Não adianta ter uma batata doce produtiva, se você não agrada o consumidor final. Por isso, queremos que a cultivar tenha um conjunto de características que agradam os clientes: seja rica em nutrientes e bonita”, finaliza.
O poder da batata doce
A batata doce é um alimento energético, constituído 85% de carboidratos. O tubérculo possui mais carboidratos, gorduras, e fibras que a batata inglesa, mais carboidratos e gorduras que o Inhame e mais proteína que a mandioca. Também é composto por micronutrientes como vitaminas C e E, do complexo B, magnésio, cálcio, ferro, fósforo, potássio e betacaroteno.
A nutricionista Lorraynne Barbosa explica que por ser um alimento rico em carboidrato, a batata doce contribui para fornecer energia ao corpo e desempenhar as funções metabólicas do organismo. “É um alimento de digestão lenta pois em sua composição contém proteínas resistentes às enzimas digestivas e fibras. Ela é composta por carboidratos complexos de baixo índice glicêmico, ou seja, a sua digestão libera glicose de forma gradual sem causar aumentos bruscos da glicemia sanguínea.”, diz.
Embora a quantidade de calorias seja maior que a de outros tubérculos, a quantidade de nutrientes também é superior. “Este fator combinado à presença de carboidratos de baixo índice glicêmico pode promover ação antioxidante, anti-inflamatória, combate ao ganho de peso e consequentemente reduz riscos de desenvolvimento de doenças crônicas”, informa a nutricionista.
A batata doce é mais consumida na forma cozida ou assada, mas também pode ser utilizada como matéria-prima na obtenção de doces, farinhas e féculas. A melhor maneira de se consumir, segundo Lorraynne, é cozida à vapor, pois mantém melhor os seus componentes nutricionais. “Outras formas que podem ser utilizadas para diversificar o consumo são em forma de purê ou inserida em saladas, sopas e preparações”.
Queridinha dos atletas
A nutricionista explica que a batata doce se tornou alimento indispensável para alguns atletas porque a digestão e a absorção lentas causam pouca liberação de insulina, na medida em que há a transformação gradativa em açúcar, sem causar grandes picos no sangue. “Não é interessante manter grande quantidade de insulina no sangue pois sendo um hormônio anabólico (de “construção” e não de “quebra”), ela conduz o açúcar para dentro das células, e, portanto, em excesso pode favorecer o acúmulo de gordura, principalmente na região abdominal”, diz.
A profissional destaca que para alguns exercícios pode não ser interessante o consumo da batata doce. “Alguns esportes de explosão necessitam de energia rápida, o atleta precisará de um carboidrato simples, ou seja, de absorção rápida para completar determinada prova ou exercício. Tudo depende do objetivo. A alimentação deve ser avaliada como um todo, levando em consideração o tipo de exercício, objetivo e características do metabolismo do indivíduo”, finaliza.
Mitos e verdades sobre o tubérculo:
1 - Ajuda a controlar o colesterol?
Verdade. Um dos carboidratos complexos presentes em sua composição é o amido resistente, sendo uma fibra solúvel, atrai moléculas de açúcar e gordura e retarda a sua absorção, evitando assim o aumento do LDL (colesterol ruim) e de triglicerídeos.
2 - Reforça a imunidade?
Verdade. Por ter um potencial antioxidante, atenua os efeitos de substâncias inflamatórias, caracterizando uma atividade imunomoduladora (aumento da resposta do sistema imunológico).
3 - Melhora o funcionamento do sistema digestivo?
Verdade. Por ter um conteúdo alto de fibras, pode ajudar a melhorar o trânsito intestinal, desde que aliada a uma dieta saudável e a ingestão adequação de água e líquidos.
4 - Favorece o emagrecimento?
Nenhum alimento sozinho “faz” emagrecer ou ganhar peso. Tudo depende do contexto em que o corpo está exposto: alimentação diária, exercícios físicos, estresse e horas de sono. A batata doce, por ser um alimento integral, composta por boa quantidade de nutrientes se inserida numa alimentação rica em fibras, pode favorecer o emagrecimento, na medida em que soma benefícios em evitar os picos de glicose sanguínea e consequentemente os níveis de insulina, reduzindo o risco de obesidade e ainda controlando o apetite.
5- Beneficia a saúde da pele prevenindo rugas?
Devido à presença de vitamina C, pode prevenir o envelhecimento precoce, se inserida numa alimentação saudável diária.
6- Só tem efeito se consumida com casca?
Mito. Apesar da casca ter maior teor de fibras, os benefícios podem ser alcançados com o consumo da polpa.
7 – A batata doce pode substituir o arroz?
Verdade. A batata doce e o arroz são do mesmo grupo alimentar: grupo energético, ricos em carboidratos.
Reportagem:
Kamylla Rodrigues, especial para a Revista CampoFotos Larissa
Melo e Sérgio Sanches
Comunicação Sistema Faeg/Senar